Tramitação da PEC 32 avança: sinal amarelo para os servidores e suas entidades sindicais

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*Por Cacau Pereira

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados aprovou, no último dia 25 de maio, a admissibilidade da reforma administrativa contida na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020.

O relatório do deputado Darci de Matos (PSD-SC) pela admissibilidade, teve voto favorável de 39 deputados, frente a 26 que votaram contra o relator. O texto aprovado trouxe mudanças na proposta original, que desenvolveremos adiante, mas, ao contrário da posição adotada por alguns segmentos do sindicalismo, não vemos razões para comemorar o resultado. A PEC seguirá agora para uma Comissão Especial, o que abrirá uma nova batalha legislativa na tramitação do projeto.

O relatório preservou, na sua essência, os objetivos da reforma. Mesmo em meio à pandemia da Covid 19, em que são restritas as possibilidades de realização de audiências públicas e amplo debate sobre o tema, o que é exigido no caso das reformas constitucionais, a Câmara dos Deputados, com maioria do Centrão, segue aliada ao governo Bolsonaro. A reforma administrativa é uma de suas pautas prioritárias, bastante prejudicial aos servidores públicos.

Mudanças introduzidas no relatório mantém a essência do projeto privatista e de destruição do serviço público

O relatório aprovado trouxe três mudanças, com relativa importância cada uma delas.

A primeira foi a exclusão do artigo com os novos princípios constitucionais – bastante adequados a uma visão empresarial e gerencialista do serviço público – que constava do texto original. Assim, o texto da Constituição permanece inalterado e não constarão os novos fundamentos.

O texto original da PEC era o seguinte:

“Artigo 37 — A administração pública direta e indireta de quaisquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, imparcialidade, moralidade, publicidade, transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública, eficiência e subsidiariedade e, também, ao seguinte” (grifo do autor).

Esta mudança foi rejeitada no relatório. Estão grafados em negrito os novos princípios que deixarão de ser incluídos: transparência, inovação, responsabilidade, unidade, coordenação, boa governança pública e subsidiariedade. Num artigo anterior [1] buscamos explicar como esses novos princípios poderiam alterar, para pior, a vida do servidor e do cidadão brasileiro. A alteração da PEC, neste ponto é, portanto, bem vinda.

De maneira bem sintética e apenas para exemplificar aos nossos leitores(as), o princípio da inovação permitiria a introdução de tecnologias que retiram o servidor do atendimento direto à população, substituindo-o por plataformas digitais, inteligência artificial e outros mecanismos e que limitam o acesso da população a esses atendimentos e serviços.

Já o princípio da imparcialidade tem sido justificado pelos defensores da “escola sem partido” para obrigar que temas científicos sejam expostos em sala de aula somente com seu contraponto religioso. Defendem, por exemplo, que a teoria criacionista do universo seja apresentada em contraposição ao evolucionismo cientifico, numa completa subversão do sentido de uma educação de caráter cientifico e laico. Esse mesmo raciocínio também tem sido esgrimido para justificar a desobrigação do Estado em não mais atender, prioritariamente, à população mais vulnerável.

Já o princípio da subsidiariedade implicaria na iniciativa do Estado deixar de ser preponderante na prestação do serviço público, frente à atuação da iniciativa privada. Esse era um dos princípios que mais preocupação vinha trazendo aos sindicatos, pela amplitude que sua interpretação enseja e as diversas alterações propostas pela PEC 32.

A segunda mudança foi a retirada do texto da proibição para acumulação de cargos por servidores das chamadas carreiras típicas de Estado. O texto original fazia restrição ao exercício de qualquer outra atividade remunerada por parte desses servidores. A definição das carreiras de Estado, no entanto, ainda será objeto de uma legislação a ser aprovada posteriormente.

A terceira e mais importante mudança foi a que retirou do presidente da República os poderes que a PEC concedia para criar, fundir ou extinguir, por decreto, órgãos e entidades da administração indireta, como as fundações e autarquias. Esse freio ao Executivo foi mantido, sendo mantida a necessária aprovação do Poder Legislativo, como hoje está consagrado. Essa sim, trata-se de uma modificação importante e que traz muitas preocupações aos servidores, dado o grau de autoritarismo da atual gestão federal.

Apesar dessas três alterações, o voto do relator foi bastante alinhado com a Exposição de Motivos da PEC, tratando as mudanças inseridas no texto como se fossem modernizadoras, voltadas aos futuros servidores e a uma “nova” administração pública, o que não é verdade. A PEC afeta e impacta, de maneira muito forte, os atuais servidores e servidoras, seus vencimentos, direitos trabalhistas e a carreira.

Se aprovada, a PEC 32 colocará os atuais servidores em carreiras em extinção, desrespeitando os direitos adquiridos no atual regime jurídico, como a estabilidade e a ocupação de funções gratificadas e comissionadas.

As manifestações convocadas para o próximo dia 19 de junho devem colocar em pauta também a luta contra a reforma administrativa, como parte da campanha nacional pelo impeachment do presidente da República.

Os sindicatos devem construir a mais ampla unidade para barrar mais esse ataque, que se destina aos servidores públicos, em primeiro lugar, mas afeta a todos os brasileiros, particularmente as camadas mais pobres e os setores mais vulneráveis do nossa população.

*Cacau Pereira é advogado Especialista em Direito Público, Mestre em Educação e pesquisador do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps)

Veja como votou cada deputado da Comissão:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

[1] Princípios constitucionais e normas programáticas: decifrando o juridiquês da PEC 32 (Reforma Administrativa), disponível em https://esquerdaonline.com.br/2020/10/16/principios-constitucionais-e-normas-programaticas-decifrando-o-juridiques-da-pec-32-reforma-administrativa/

 

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