Por Bernardo Pilotto*
Na semana passada estive em Dois Vizinhos, cidade localizada no Sudoeste paranaense, para uma Audiência Pública sobre a Reforma da Previdência (PEC 287) e a Reforma Trabalhista. Há uma série de reflexões políticas a serem feitas a partir desta atividade.
A Audiência foi fruto de uma articulação de vários sindicatos locais, associações, estudantes e pastoras sociais. No dia 15 de março, a convocação dessa articulação para um protesto contra a Reforma da Previdência (que aconteceu simultaneamente em muitas cidades brasileiras) tinha atraído cerca de 2000 pessoas para a rua, no que pode ter sido a maior manifestação da história da cidade.
Audiência Pública em Dois Vizinhos reuniu mais de 200 pessoas.
A mobilização e a unidade entre esses vários movimentos impactaram a cidade. Como resultado, presenciei uma Audiência Pública com mais de 200 pessoas, estando entre essas o prefeito de Dois Vizinhos e boa parte dos vereadores da cidade. Na oportunidade, o prefeito e os vereadores se comprometeram a fazer uma carta cobrando dos(as) deputados(as) federais e senadores(as) paranaenses que votem não ao atual formato da PEC 287.
Além da pressão popular, o que move esse posicionamento dos Poderes de Dois Vizinhos é o profundo impacto que a Reforma vai trazer a estas cidades. Na cidade, dos cerca de 40.000 habitantes, mais de 10.000 receberam algum benefício do INSS no ano de 2016. O adiamento do momento de receber este benefício (tanto pela diminuição de trabalhadores com vínculo CLT por conta da terceirização quanto porque os(as) trabalhadores(as) vão demorar até 10 anos a mais para se aposentar) vai impactar profundamente o comércio e demais atividades econômicas da cidade. No restante do Sudoeste, o cenário é parecido. Ao longo do interior do Brasil, provavelmente a situação também é essa.
Quando pensamos em mobilização popular, normalmente priorizamos a análise sobre o que acontece em São Paulo, Rio de Janeiro e outras grandes capitais. E isso está certo, pois lá estão os grandes centros econômicos, indústrias etc. Mas saí de Dois Vizinhos com a certeza de que a mobilização em cidades médias e pequenas do interior do Brasil será fundamental para derrotar a Reforma da Previdência.
Isso porque a Reforma atinge a todos e todas, o que vem permitindo uma unidade grande entre sindicatos e movimentos que até ontem não estavam conversando. Em Dois Vizinhos, por exemplo, a articulação contra a PEC 287 envolve educadores(as) municipais, estaduais e federais (através do Sindicato dos Professores Municipais de Dois Vizinhos, da APP-Sindicato, do SINDITEST e do SINDUTFPR), motoristas, avicultores(as), trabalhadores(as) rurais, a Igreja Católica, os(as) demais servidores(as) municipais e estudantes.
E essa unidade tem o potencial (já verificado em Dois Vizinhos) de pressionar o poder local a se posicionar contrariamente à Reforma, até porque ela também os impacta diretamente. E sabemos que os(as) prefeitos e vereadores(as) dessas cidades são ligados(as) a deputados(as) estaduais e federais. E são esses últimos que votarão a Reforma, que a cada dia que passa será votada mais perto das eleições de 2018.
Acredito que nossa pressão tem produzido resultados: no levantamento do jornal Gazeta do Povo, de Curitiba, mais da metade dos(as) deputados(as) federais paranaenses disse não a esta Reforma. E a pressão precisa continuar, visto que muitos(as) podem mudar seu voto apenas por pequenas emendas que não aliviam os efeitos maléficos da proposta de Temer.
O que vi em Dois Vizinhos merece registro e merece ser replicado por todo esse imenso Brasil. É mais uma força para mostrar que o 15M não foi um dia isolado de lutas e sim o retorno de um protagonismo maior dos(as) trabalhadores(as) diante da conjuntura tão adversa que vivemos.
*Bernardo Pilotto é sociólogo e técnico-administrativo no HC/UFPR. Atualmente é diretor do SINDITEST-PR (Sindicato dos Técnicos-Administrativos em Educação da UFPR, UTFPR, Unila e Funpar/HC).