A partir da mesa “Mulheres Negras: construindo a resistência”, que ocorreu ontem, 23, na parte da manhã, convidadas e participantes trocaram experiências sobre os tipos de opressões que as mulheres negras estão submetidas.
“Já sofri tentativa de homicídio, já jogaram garrafa de água cheia de cima de prédio em cima de mim, me xingaram de macaca. O caso mais chocante foi quando tentaram tacar fogo no meu cabelo”, contou Eligeane Graciano, participante do evento. Ao relatar vários atentados racistas que ela sofreu, chamou atenção para o caso recente de uma menina de 15 anos sofreu racismo extremamente violento dentro de um ônibus em Curitiba “Quando a gente fala em racismo é risco de vida mesmo. E além de ser pela cor da pele é por ser mulher”.
Racismo e machismo
Compondo a mesa, Martina Gomes, educadora da rede estadual no Rio Grande do Sul e militante do Quilombo Raça e Classe, explicou que para o conjunto das mulheres está posta a ideia de que a mulheres são o sexo frágil, contudo, para as mulheres negras isto não se aplica. Os estupros coletivos das mulheres negras nas senzalas, a hiperssexualização de seus corpos (padrão Globeleza), o mito de que mulher negra “aguenta mais” quando precisa de assistência à saúde, segundo Martina, são alguns exemplos de como essa construção racista e machista tem sido feita.
Martina declarou que há uma grande dificuldade das mulheres negras se reconhecerem no movimento feminista como um todo porque a pauta não as contempla por completo. “Entre as mulheres existem uma série de diferenças e não identificar é uma impossibilidade pra que a gente possa nos reconhecer e lutar juntas”.
Resistência
Segundo o Dossiê Mulheres Negras (SEPPIR-2009), um quarto da população do Brasil é de mulheres negras, sendo que 50% deste total são chefes de família e que, no entanto, possuem as menores rendas do país, com postos de trabalho mais precarizados.
Neste contexto, são as mulheres negras as mais atingidas pelo PL 4330 (terceirizações), pelas MPs 664 e 665 (que restringem o direto ao seguro-desemprego, abono do PIS e recebimento de pensão por morte) e pelas demais retiradas de diretos trabalhistas. “São 350 anos de escravidão para 120 de trabalho assalariado, é muito recente esse processo”, situou Martina. “No contexto de restrição de direitos a primeira parcela a ser atingida são as mulheres negras”.
Apesar de tantos obstáculos, a educadora revelou que há também um forte movimento de resistência que se firma diante desta realidade e citou o caso do levante protagonizado na periferia por mulheres negras após tortura e assassinato do pedreiro Amarildo Dias de Souza por Policiais militares no Rio de Janeiro. “Se é verdade que viemos sofrendo ataques, é verdade que somos a linha de frente na reação”, sublinhou Martina.
Mulheres Pretas têm História
O III Encontro é preparatório para o Seminário do Movimento Mulheres em Luta que ocorre em julho em São Paulo, cujo tema é “Mulheres Pretas têm História”. “Enquanto as Sufragistas lutavam pelo direito ao voto, o nosso movimento era pela libertação da escravidão, libertação de nossos corpos. Várias mulheres negras foram protagonistas dessa história e isso não é conhecido”, frisou Martina, ressalvando a importância da luta das mulheres brancas ao voto.